Às 5 horas da manhã daquele dia, saímos em direção ao Estado de Goiás; mais especificamente, para a cidade de Jussara.
Seria minha primeira ida a cidade onde ocorreu o acidente que transfigurou minha vida. Um retorno.
Por termos saído tão cedo, o frio e chuva foram companhia constantes até o nascer do sol no centro do planalto, em sua altitude que permite cores fortes às luzes do astro rei.
Em meu íntimo também havia frio, pois não tinha certeza de como seria esta aventura ou experiência e agora posso afirmar que tremia por dentro e por fora.
Ao chegamos à casa de meus avós, vi no olhar de minha avó o mesmo sofrer dos olhos de minha mãe e junto a isso a expressão no rosto de quem não acredita no que vê, ou não quer acreditar. Minha querida avó tentava suprimir as lágrimas como quem tenta fazer barreiras para as águas de chuvas torrenciais. Mas ela sorria.
Por ser fim de ano seguimos para uma fazenda onde passaríamos a noite de Ano Novo.
Lugar quente e de muita umidade. À noite, dormíamos com portas e janelas abertas, o que trazia lembranças de quando pisava no chão e tinha condições de sozinho sair e olhar as estrelas; de ficar sentado em um canto do alpendre; deixar o olhar se perder e, por vezes, acompanhar um ou outro vaga-lume ao som dos bichos que à noite se sentem mais a vontade.
Durante o dia, o quente dia, deste mesmo alpendre, naqueles dias de fim de ano, ficava a observar a frondosa arvore que trazia sombra para a frente da casa e um campinho de futebol onde os familiares jogavam bola.
Essas foram as mais difíceis visões, pois antes tudo isso habitava o imaginário e os sonhos. Nesses sonhos eu também jogava bola. Houve breve tristeza, porém ausente de dor, pois o fato de ter a família quase toda reunida para as festividades aliviava mente e coração.
Sinto saudades do que hoje não posso fazer, no entanto faço festa para o que hoje faço e que antes sequer passava um fio deste futuro pela imaginação.
Após as festas, retornamos para Jussara e eu quis ficar sentado em minha cadeira na frente da casa de uma tia, para ali comer alguns pães-de-queijo caseiros que são viciantes – vício que ainda vigora – e vi, então, um homem de chapéu e roupas simples adentrando a rua com caminhar compassado, sem pressa, olhar para frente e, quando passou por mim, olhou-me de tal forma que descrevo assim:
_ Quando aquele homem olhou para mim era como se não me visse; era como se seu olhar atravessasse minha cabeça e visse somente as marcas de cimento do muro. Era como se eu não existisse. Era estranho.
Isso pode ter sido fruto de uma mente cheia de expectativas e trouxe medo do que viria depois, mas não me fez desistir. Fez-me querer ainda mais prosseguir e agradeço àquele humilde homem.
Fiz planos e somente vivo, em corpo e mente, poderei executá-los.
Até a próxima.
Angelo Márcio.